Tribunal de Justiça julga improcedente denúncia contra ex-prefeito de São Miguel do Iguaçu e outros envolvidos em contrato durante pandemia
07/05/2024 São Miguel do Iguaçu
Decisão destaca contexto excepcional e falta de dolo específico

O Tribunal de Justiça do Paraná, por meio da Vara Criminal da Comarca de São Miguel do Iguaçu, julgou improcedente a denúncia do Ministério Público contra o ex-prefeito Claudiomiro da Costa Dutra, o ex-secretário municipal de saúde Luiz Antônio Klajn e o empresário Ahmad Ali El Zein.

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A denúncia dizia respeito a supostas irregularidades na contratação de uma empresa para prestação de serviços médicos durante a pandemia da COVID-19 em 2020.

O Ministério Público argumentou que a dispensa ou inexigibilidade de licitação fora das hipóteses previstas em lei, por si só, caracterizaria crime. No entanto, o Poder Judiciário não identificou o dolo específico na conduta dos denunciados.

A decisão destacou o contexto excepcional vivenciado durante a pandemia do COVID-19, reconhecendo os desafios enfrentados pelos administradores públicos na época. A urgência em atender às necessidades da população, somada às orientações contraditórias emitidas pelas esferas federal e estadual, dificultou a tomada de decisões.

No caso em questão, o município de São Miguel do Iguaçu optou por realizar uma inexigibilidade de licitação para credenciar empresas para prestação de serviços médicos. Embora essa não fosse a orientação do Tribunal de Contas, os acusados apresentaram justificativas concretas para essa escolha.

O contrato em questão foi cancelado e nenhum pagamento foi efetuado após a denúncia do Ministério Público e a atuação fiscalizatória do Tribunal de Contas do Paraná. Além disso, a decisão ressaltou que não houve dano ao erário, pois a inexigibilidade foi revogada e o contrato não foi executado.

Confira um trecho da decisão abaixo:

Todavia, oportuno apontar que a exigência do dolo específico não transforma o delito em crime material, sendo prescindível a ocorrência de dano ao erário.

Em conclusão: 1) a promoção da dispensa ou inexigibilidade de licitação fora das hipóteses previstas em lei, por si só, não caracteriza crime; 2) a promoção da dispensa ou inexigibilidade de licitação fora das hipóteses previstas em lei, quando demonstrada a intenção deliberada de causar lesão ao erário, caracterizará o crime em comento, mesmo que o dano ao erário não ocorra.

No caso, não se vislumbra nenhum dano ao erário, na medida em que a Inexigiblidade n.º 25/2020 foi revogada e o contrato dela decorrente não foi executado.

[...]

O primeiro ponto a ser considerado é a situação de excepcionalidade vivenciada na época do fato, qual seja, a pandemia do COVID-19. É de conhecimento público e notório a situação caótica ocorrida em escala global, afetando especialmente o setor de saúde e a saúde pública.

A pandemia foi um desafio para os administradores públicos, principalmente em razão da cobrança de pronto atendimento das necessidades da população, de forma urgente e eficaz, muitas vezes apenas para minimizar a perda de vidas.

Além disso, por vezes as esferas federal e estadual emitiam orientações contraditórias, dificultando ainda mais a atuação do administrado local. Nesse sentido, entendo que não há como cobrar do Poder Executivo local a atuação de determinada forma, sem levar em conta a singularidade da situação. É fácil e até injusto rever uma decisão tomada durante uma tempestade, quando já alcançada a calmaria.

No caso, o Município de São Miguel do Iguaçu decidiu realizar um procedimento licitatório na modalidade inexigibilidade, para credenciar pessoas jurídicas para prestar serviços médicos. O Ministério Público alega que esta deveria ser a última opção, devendo ser precedida de realização de processo seletivo simplificado (PSS) e credenciamento de pessoas físicas.

Os Acusados CLAUDIOMIRO e LUIZ justificaram que a contratação por PSS era inviável, visto que realizada tentativa anterior e não houve interessados. A contratação de empresa por outra modalidade de licitação seria inviável em virtude dos prazos longos e da urgência. Nada esclareceram sobre a possibilidade de credenciamento de pessoas físicas, apenas alegando que seria demorado.

Portanto, percebe-se que a solução empregada não seguiu a orientação emanada pelo Tribunal de Contas, mas os Acusados CLAUDIOMIRO e LUIZ apresentaram fundamentação concreta para a escolha da medida tomada.

O procedimento licitatório foi submetido à apreciação do Tribunal de Contas, com a elaboração de relatório com diversos apontamentos para regularização. Dessa forma, é possível concluir que a regularização da contratação era possível, embora não recomendável.

Destaco que o relatório do Tribunal de Contas apontou que a Inexigibilidade n.º 25/2020 basicamente repetiu os serviços médicos que constam na Concorrência n.º 01/2017, inclusive quanto aos preços contratados. O questionamento da Corte de Contas foi referente a forma de fiscalização e quantificação do serviço prestado, bem como sobre o aumento da demanda, o que poderia acarretar sobrepreço.

Entretanto, o Município decidiu revogar a licitação e aditar a concorrência vigente, passando a adquirir através dela os serviços necessários para atendimento da população durante a pandemia.

Portanto, percebe-se que houve a desistência espontânea da execução do contrato firmado, em atendimento a recomendação do Tribunal de Contas, circunstância que, em meu ponto de vista, corrobora a tese de que os Acusados não agiram com dolo de causar lesão ao erário.

[...]

Neste cenário, diante das circunstâncias apresentadas, verifica-se que as provas insculpidas no caderno processual são insuficientes para demonstrar indubitavelmente e com a clareza necessária que os Acusados CLAUDIOMIRO DA COSTA DUTRA, LUIZ ANTONIO KLAJN e AHMAD ALI EL ZEIN teriam praticado o fato narrado na denúncia.

Destarte, diante de todos os elementos juntados aos autos, em observância ao princípio in dubio pro reo, outra conclusão não se pode extrair a não ser aquela que conduz à constatação de que os Acusados CLAUDIOMIRO DA COSTA DUTRA, LUIZ ANTONIO KLAJN e AHMAD ALI EL ZEIN não podem ser condenados pela prática do delito que lhe foi imputado.

Processo 0001405-92.2022.8.16.0159

Fonte: Guia Medianeira
Foto: Claudio Henrique/Guia São Miguel

 
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