A 'geada negra' de 1975 que acabou com a produção de café e transformou o Paraná no que ele é hoje
16/07/2021 História
Daniel Panobianco - Portal Memória brasileira - JWS

Foi no amanhecer de 18 de julho de 1975 que uma das geadas mais intensas do século passado reduziu a zero a área cultivada com café no Estado do Paraná. Em escala maior, o próprio Paraná nunca mais foi o mesmo. Aquela manhã fria, aliada a outros fatos ocorridos na mesma época, disparou uma série de transformações econômicas e demográficas que fizeram do Estado o que ele é hoje.

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O governador da época, Jayme Canet, foi ver as perdas no norte do Paraná..

As estatísticas dão uma dimensão grandiosa dos eventos daquele dia. Na safra de 1975, cuja colheita já havia sido encerrada antes da geada, o Paraná havia colhido 10,2 milhões de sacas de café, 48% da produção brasileira.

Era o maior centro mundial nessa cultura e tinha uma produtividade superior à média nacional. No ano seguinte, a produção foi de 3,8 mil sacas. Nenhum grão de café chegou a ser exportado e a participação paranaense na produção brasileira caiu para 0,1%.

Nos dias seguintes já começava a consolidar-se uma idéia de que o estrago seria duradouro. O governador Jayme Canet Júnior anunciava que o orçamento do Estado seria reduzido em 20% no ano seguinte.


Cafezal queimado pela geada entre Mandaguari e Marialva, no Norte do Paraná.

O prognóstico dos especialistas era de que o prejuízo chegaria a Cr$ 600 milhões (o equivalente, pela cotação da época, a US$ 75 milhões), apenas nas lavouras de café. Outras culturas, como o trigo, também sofreram perdas importantes, de mais de 50%. Mas era o café que sustentava a economia do Paraná naquela época – uma situação que mudaria logo em seguida, já que os cafeicultores nunca mais se recuperariam desse impacto.


Milhares de trabalhadores, como estes de Rolândia, foram obrigados a migrar para o Mato Grosso ou Rondônia.

Em uma geração muita coisa pode mudar. Mas parece certo que a geada negra de 1975 foi um daqueles raros momentos em que um único fato é capaz de precipitar mudanças históricas. “É bem difícil imaginar como seria o Paraná hoje se a geada não tivesse ocorrido”, diz o agrônomo Judas Tadeu Grassi Mendes, que à época trabalhava na Secretaria de Agricultura do Estado e hoje é pró-reitor acadêmico do Centro Universitário FAE, em Curitiba. “O mais provável é que tudo o que aconteceu de 1975 para cá – a perda de importância da agricultura cafeeira, a supremacia da soja, o fortalecimento das cooperativas, a migração, a industrialização – tivesse lugar do mesmo jeito, mas não à mesma velocidade”, opina. Movida pelo vento frio da História, no entanto, a vida dos paranaenses nunca mais foi à mesma.

A geada negra de 1975, que mudou a história paranaense ao aniquilar a principal cultura agrícola existente no Estado, tornou a vida difícil para muita gente. Ao mesmo tempo, outros fatores surgiram para dar um empurrão extra. No oeste do Estado, a construção da usina de Itaipu obrigou pelo menos 8 mil agricultores a deixarem suas propriedades, gerando uma demanda por terra que não tinha como ser suprida na região.


Pátios de secagem, como este de Arapongas, acabaram sendo abandonados.

Ao mesmo tempo, culturas tradicionais no Estado, como o trigo e o algodão, sofriam com o clima e com a conjuntura econômica. Em escala menor, uma geada ocorrida em 1983 repetiu para os produtores de trigo o estrago que os cafeicultores haviam sentido oito anos antes.

Produtores de lugares como Cornélio Procópio, Loanda, Maringá, São Miguel do Iguaçu e Engenheiro Beltrão começaram a sonhar com as terras planas e baratas de que se falava, mais ao Norte. Começou então um movimento migratório impressionante, o que fez com que o Estado perdesse 13% da população ao longo dos anos 80.


Capa do extinto “Jornal Panorama”.

O Estado de Mato Grosso foi um dos principais destinos. A magnitude da migração pode ser avaliada pelos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), feita pelo Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE).

Em 2001, a Pnad mostrava a presença de 248 mil pessoas residentes em Mato Grosso que declaravam ter nascido no Paraná – o equivalente a 9,6% da população total, e o maior contingente de migrantes no Estado. A pesquisa também não deixa dúvidas sobre o que eles foram fazer por lá: 68% deles vivem em áreas rurais.

Não demorou muito e Rondônia era a terra de visão do futuro. A maioria das famílias que hoje residem em solo rondoniense, são frutos e/ou vitimas do caos que foi a onda de frio no Sul do Brasil entre as décadas de 70 e 80.


Capa do jornal “O Estado do Paraná”
 
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